Consórcio que fará acesso à ponte em Porto Murtinho exigiu 121% mais que concorrente
15:32 17/11/2023
Empresa que cobrava R$ 279 milhões desistiu após pausa no pregão. Depois disso, Dnit fechou acordo para pagar R$ 472,4 milhões, o que é 69,3% acima da menor proposta
O consórcio que venceu a licitação para as obras de acesso à ponte sobre o Rio Paraguai, em Porto Murtinho, apresentou lance inicial 121,6% maior que uma das concorrentes, mas mesmo assim acabou sendo a escolhida para construir a aduana e os 13 quilômetros interligando a BR-267 à ponte sobre o Rio Paraguai, projetos fundamentais par viabilizar da chamada rota bioceânica.
Conforme a ata que está disponível no site do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (DNIT), a pedida inicial do consórcio denominado PDC Fronteira, formado pelas empreiteiras Caiapó, Paulitec e DP Barros, de Goiás e São Paulo, foi de R$ 665 milhões.
A empresa Entec Empreendimentos, com sede no Maranhão, por sua vez, se ofereceu para executar o projeto por R$ 300 milhões, o que é menos da metade da concorrente. Da disputa participavam outras duas empresas, que pediram R$ 650 milhões (Construtora Sanches Tripolon) e a outra, R$ 650,9 milhões (Santa Luzia Engenharia e Construções).
Logo após receber as propostas por meio eletrônico, às 10:15 minutos do dia 16 de outubro, a pessoa responsável pela disputa alertou que “os lances estão muito acima do acima do estimado pela Administração”, apesar de um deles estar muito abaixo daquilo que o poder público estava disposto a pagar.
Depois disso, durante 45 minutos o representante do Dnit pediu para que os interessados mandassem novas propostas, com valores menores. “Vamos senhores, garanto-lhes que a maioria dos lances ofertados estão acima do estimado para contratação”, diz a ata.
Até então, pelo menos em tese, nenhum dos interessados sabia o valor que o poder público estava disposto a desembolsar. Diante disso, a Entec, reduziu sua pedida para R$ 279 milhões. O consórcio PDF Frontreira, por sua vez, enviou mais quatro propostas, reduzindo sua exigência para R$ 590 milhões. Os outros dois “interessados”, mantiveram seus pedidos originais.
Depois disso, o leiloeiro passou a falar diretamente com a Entec, perguntando, entre outras questões, se era possível reduzir ainda mais sua proposta. O representante da empresa, porém, informou que não poderia melhorar o valor, que depois disso foi tornado público para os demais participantes do leilão.
Somente então é que as outras empresas tomaram conhecimento da menor proposta. Nos minutos seguintes, a empreiteira recebeu uma série de orientações para envio de alguns documentos e foi informado que a reunião seria retomada no dia seguinte, em 17 de outubro.
Conforme recomendado, os documentos foram enviados, mas para surpresa de todos, a Entec misteriosamente desistiu da disputa. Os motivos não foram apresentados na ata e somente os proprietários da empresa poderiam informar o que aconteceu do dia 16 para 17 de outubro para que desistissem do contrato depois de todo o esforço para estudar o edital, elaborar o projeto e participar do pregão eletrônico.
“Srs. fornecedores, a licitante ENTEC EMPREENDIMENTOS LTDA encaminhou carta informando da sua desistência no presente certame”, resumiu-se a informar a pessoa que estava presidindo o pregão.
Diante disso, nova reunião foi marcada para o dia 19. Neste dia, o leiloeiro abriu o leilão dizendo que “com a desistência da licitante ENTEC, informo que os demais valores ofertados encontram-se muito acima do estimado pela Administração. Considerando que o orçamento estimado é sigiloso, invoco o estabelecido no Acórdão 306/2013 – TCU Plenário: Nas licitações regidas pelo RDC é possível a abertura do sigilo do orçamento na fase de negociação de preços com o primeiro colocado, desde que em ato público e devidamente justificado. Informo que o valor estimado é de R$ 472.426.011,93. Portanto, negociarei com a licitante CONSTRUTORA CAIAPO LTDA, cujo lance apresentado foi de R$ 590.000.000,00”.
A empresa Caiapó estava encabeçando o consórcio PDC Fronteira e em meio a essa negociação acabou reduzindo sua pedida para R$ 472.410.911,22, fechando o contrato em cerca de R$ 15 mil abaixo do teto estipulado pelo DNIT.
Isso representa redução de 28,9% em comparação com a exigência inicial, que fora de R$ 665 milhões. Porém, é 69,3% acima dos R$ 279 milhões pelos quais a Entec estava disposta a executar o projeto.
CURIOSIDADES
O curioso é que os técnicos de todas as quatro empresas tiveram acesso ao mesmo edital e mesmo assim chegaram a propostas com variação superior a 121%. Por outro lado, é curioso também que duas das concorrentes apresentaram variação de apenas R$ 953.782,14, o que equivale a diferença de 0,14%.
E foram justamente essas duas que não fizeram nenhuma redução em suas exigências iniciais durante o certame, evidenciando que estavam pouco interessadas em assumir a obra. A Entec, aquela que desistiu, chegou a fazer um desconto de 7%. A vencedora da disputa ofereceu abatimento de 11,2% antes de saber o valor que o DNIT estava disposto a pagar.
O resultado desta licitação foi divulgado nesta quinta-feira (16) e ainda não existe data exata para início das obras, que devem ser concluídas em 26 meses. Conforme a proposta vencedora, somente a terraplanagem dos 13 quilômetros que separam a BR-267 da cabeceira da ponte terão o impressionante custo de R$ 145,9 milhões..
Na construção da estrutura aduaneira, que faz parte do pacote, serão outros R$ 126,6 milhões. O item “obras de arte especiais” vai demandar mais R$ 101,5 milhões.
Tanto a estrada quanto a aduana terão de ser construídos sobre um gigantesco aterro, já que esta região do pantanal é passível de alagamentos. A cidade de Porto Murtinho é toda circundada por um dique de 11 metros de altura, o que impede que a água do Rio Paraguai invada a cidade em período de cheia.
O terminal portuário de Porto Murtinho, do qual foram despachadas quase dois milhões de toneldas de soja neste ano, está na área interna deste dique. Mesmo assim, foi construído sobre um aterro de 25 hectares e que está cinco metros acima do nível da maior cheia do último século. A ponte e a estrada ficarão na parte externa do dique.
A ponte sobre o Rio Paraguai está sendo considerada fundamental para viabilizar rota bioceânica, um corredor que promete facilitar o acesso aos portos chilenos, passando pelo Paraguai e a Argentina. A ponte, que está com cerca de 40% dos trabalhos concluído, está sendo custeada pela Itaipu Binacional.
Mas a estrada de acesso e a aduana serão bancados pelo Governo Federal. Por conta disso, está prevista para a próxima semana, dia 24, a vinda do vice-presidente, Geraldo Alckmin, para uma espécie de vistoria nas obras da ponte, que terá 1,3 mil metros de extensão
ROTA
A Rota Bioceânica é um corredor rodoviário com extensão de 2.396 km que ligará os oceanos Atlântico e Pacífico, partindo do Brasil e chegando aos portos de Antofagasta e Iquique, no Chile, passando pelo Paraguai e Argentina.
O projeto que começou a ser debatido em 2014 e que iniciou em 2017 promete ampliar a relação comercial do Estado com países asiáticos e sul-americanos.
Conforme estudo da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), os custos para o envio da produção sul-mato-grossense serão reduzidos, além do tempo de viagem, que será encurtado em até 17 dias rumo ao mercado asiático.
Esse corredor, conforme os mais otimistas, terá potencial para movimentar US$ 1,5 bilhão por ano em exportações de carnes, açúcar, farelo de soja e couros para os outros países por onde passará.
O Correio do Estado procurou a assessoria do Dnit em busca das explicações que a Entec apresentou para desistir da disputa, mas até a publicação dessa reportagem não havia recebido retorno.
Via Correio do Estado MS
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