Campo Grande

Dias das Mães será na prisão para 315 mulheres em Campo Grande

Circuito MS

17:40 07/05/2022

Defensor público esclarece que a maioria das mulheres encarceradas foi usada como mula para o tráfico de drogas

Embora este domingo (8) seja marcado nacionalmente como uma data comemorativa, nas penitenciárias femininas de Campo Grande não há motivo para festejar. São 315 mães privadas da liberdade, oito delas gestantes, e três bebês nascidos no cárcere.

O problema perdura após a audiência de custódia, quando os indivíduos presos em flagrante são levados à presença do juiz para análise do caso.

Visto pelo âmbito populacional, o cenário na capital sul-mato-grossense acompanha a curva de crescimento dos índices nacionais de mães encarceradas. De abril de 2021 a maio deste ano, Campo Grande registrou 2.745 pessoas reclusas por crimes diversos. Desse número, 376 são mulheres.

De acordo com o Supremo Tribunal Federal (STF), mulheres gestantes e mães de crianças de até 12 anos, que estejam cumprindo prisão preventiva, por meio de habeas corpus coletivo, têm direito à prisão domiciliar.

Entretanto, não é o que acontece na grande maioria dos casos nas penitenciárias femininas brasileiras, tampouco nas unidades prisionais de Campo Grande.

O defensor público e coordenador do Núcleo Criminal Institucional (Nucrim) de Campo Grande, Gustavo Henrique Pinheiro Silva, ressalta que a decisão não pode ser baseada apenas no fato criminal e expõe a resistência de alguns juízes ao cumprimento da lei estabelecida pelo STF em 2018 (HC 143.641/SP) e incrementada pelas diretrizes do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que visam orientar tribunais e garantir o cumprimento das normas.

“Infelizmente, observamos uma certa resistência de juízes e de tribunais de Justiça. Por exemplo, às vezes eles entendem que a quantidade de drogas apreendidas é suficiente para manter a pessoa presa. Com todo respeito, eu entendo como uma decisão criticável. Porque não foi esse o vetor que o STF determinou que todos aplicassem”, explica.

MULHERES NO CÁRCERE

Segundo o defensor, cerca de 75% das mulheres encarceradas em Campo Grande obtêm a concessão de liberdade. Os outros 25% acabam recebendo a prisão preventiva durante a audiência de custódia. Decisão que pode ser revogada pela Defensoria Pública, quando necessário.

Ainda de acordo com dados levantados pelo Nucrim, 55% dos presos recebem a sentença de prisão preventiva e 45% a liberdade provisória, com uso de tornozeleira eletrônica.

O coordenador evidencia que o pedido de custódia é feito amparado por múltiplos elementos, como ausência de violência. Fator que pode ser um dos determinantes para que o índice de soltura de mulheres ultrapasse a dos homens.

“O primeiro fator possível é a medida estabelecida pelo STF, e depois pelas leis que exigem que seja feita uma análise mais delicada do caso, porque o pedido de prisão não afeta só a pessoa encarcerada, aquilo se espraia para outros integrantes da família, principalmente as crianças. Na situação carcerária nacional, nem sempre é possível garantir todos os direitos das mulheres lactantes”, pontua.

A gestação de mulheres privadas de liberdade é considerada de alto risco no País, em razão do cenário traumático tanto para a grávida quanto para o bebê. Também em razão da alta probabilidade de transmissão de doenças, como sífilis e tuberculose, bem como da falta de convívio familiar.

Campo Grande possui oito gestantes em penitenciárias e três bebês no Estabelecimento Penal Feminino Irmã Irma Zorzi.

PERFIL

Gustavo Henrique descreve o perfil das mulheres encarceradas como usualmente mães, de baixa escolaridade, baixa renda e geralmente negras e pardas, com muitos filhos. Ele destaca que grande parte delas acaba sendo presa por tráfico de drogas.

Outra situação relatada pelo defensor é a falta de sensibilidade de alguns juízes em exigir que a mulher comprove ser essencial para os cuidados do filho.

“Eles parecem esquecer que a conduta da mãe, em si, não é de periculosidade, na grande maioria. Às vezes, estamos falando de crianças, de meses, como recentemente, em que a criança tinha três ou quatro meses” acrescenta.

Para o coordenador, é necessário estudar os casos por um viés psicossocial. Cláudia Araújo de Lima, mestre e doutora em Saúde Pública e pós-doutoranda em Direitos Humanos também compartilha da mesma opinião.

“O sistema prisional brasileiro precisa trabalhar humanização para mulheres, gestantes e mães que precisam de acompanhamento psicossocial, para que não se percam os vínculos dessas mulheres com seus filhos. Essas crianças são tiradas das mães e não voltam”, ressalta.

O defensor público admite que houve uma diminuição no índice de mulheres presas, mas que o número está longe do ideal. Conforme Gustavo Henrique, ainda existe a necessidade de refinar as decisões judiciais.

“A gente ainda continua com a lupa só no fato criminoso, qual pena será aplicada, se é hediondo, se não é, e acaba esquecendo que o protagonista da decisão é a criança, por um desvio, muitas vezes pontual. Muitas vezes por extrema necessidade, visando inclusive a melhora da condição familiar,” conclui.

Via Correio do Estado MS

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