Saúde

Estudo brasileiro revela mecanismo de alta transmissão do coronavírus

Circuito MS

7:50 23/05/2022

Pesquisa inédita mostrou como algumas proteínas formam a superfície do coronavírus

Uma pesquisa inédita mostrou como algumas proteínas que formam a superfície do coronavírus podem estar desempenhando um papel fundamental na capacidade elevada de replicação de algumas de suas variantes.

A principal proteína envolvida nessa função é a não-estrutural 6 (NSP6, na sigla em inglês) que, quando sofre uma mutação, acaba criando uma ligação melhor entre estruturas envolvidas no processo de multiplicação do Sars-CoV-2 e da célula hospedeira. Outras envolvidas são a NSP3 e a NSP4.

Essa conexão mais “refinada” entre o compartimento contendo o vírus dentro da célula e outros componentes celulares também atua impedindo a defesa natural do organismo contra o invasor, por isso ela garante maior sucesso replicativo.

Entre as variantes de preocupação (VOCs, na sigla em inglês) que carregam essa mutação estão a alfa, gama (que surgiu em Manaus), lambda e a subvariante BA.2, da ômicron, que já é predominante no Brasil.

A descoberta foi divulgada em artigo na revista Nature, a mais prestigiosa do meio científico, no último dia 12. A pesquisa é fruto de colaboração entre cientistas do Instituto Oswaldo Cruz, da Fiocruz, no Rio de Janeiro, e do Instituto Telethon de Genética e Medicina (Tigem), em Nápoles, na Itália.

Para investigar os mecanismos celulares envolvidos na multiplicação do coronavírus dentro do nosso organismo, os pesquisadores buscaram entender a relação da NSP6 com estruturas presentes em todas as nossas células que acabam sendo sequestradas para o processo de síntese do Sars-CoV-2.

Entre elas estão a vesícula replicativa de dupla membrana, que é uma espécie de bolsa em que o vírus vai fazer a síntese do seu material genético na célula (protegido do meio externo celular), o retículo endoplasmático, cuja função é produzir diversas moléculas como lipídios e proteínas essenciais para os processos celulares, e os corpúsculos lipídicos, que são estruturas ricas em lipídios (gordura) no interior das células.

Basicamente, a NSP6 consegue atuar organizando e criando canais de comunicação mais eficientes entre a vesícula replicativa (onde está o genoma viral) e as duas outras estruturas.

“O vírus, quando ele invade a célula, ele utiliza a maquinaria presente nas células hospedeiras para fazer o seu processo de replicação, e o coronavírus Sars-CoV-2, assim como outros vírus, faz esse processo em locais que são as vesículas de dupla membrana. Como essas vesículas precisam de componentes para se formar, é aí que a comunicação fornecida pela NSP6 atua, organizando esse processo replicativo”, explica Patrícia Bozza, chefe do Laboratório de Imunofarmacologia do Instituto Oswaldo Cruz e uma das autoras do estudo.

Além disso, a NSP6 consegue filtrar a passagem de lipídios do retículo endoplasmático para o citoplasma, mas impede a passagem de proteínas que poderiam reconhecer o invasor e atacá-lo no interior celular.

“Essa comunicação, portanto, é feita de uma forma que favorece a passagem de lipídios, necessários para as vesículas replicativas, mas restringindo algumas outras proteínas. Esse é um dos mecanismos que podem atuar nessa maior replicação”, disse.

Ainda de acordo com a pesquisadora, a deleção de uma parte final da NSP6 (mais especificamente três aminoácidos, que são as unidades que formam as proteínas), consegue oferecer um arranjo melhor, organizando as organelas replicativas em cachos compostos de 15 unidades.

Sem essa deleção, o número de unidades por cachos caía para três, além de ter um formato irregular.

“A observação que fizemos comparando as diferentes variantes que carregam essa mutação com a forma original de Wuhan é que essa mutação surgiu de maneira independente nas linhagens e foi selecionada porque confere vantagem, ou ganho de função, para o vírus”, afirma.

A pesquisa desenvolvida pelos cientistas é chamada básica, ou seja, partiu de uma investigação para entender o funcionamento de um determinado processo. Porém, Bozza explica que conhecer tais alvos pode ajudar, no futuro, a desenvolver terapias mais eficazes contra o Sars-CoV-2.

“O estudo buscou entender quais são os elementos importantes para o vírus se estabelecer e replicar na célula, mas isso tem uma relevância também para entender quais os alvos que atuam na replicação tanto do ponto de vista do vírus quanto da célula hospedeira, podendo desenvolver antivirais que ajam nesses mecanismos”, completa.

Via Correio do Estado MS

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