Barbeiro há 47 anos, Lázaro tem cliente esperando na porta às 5h30 da manhã
9:20 18/02/2019
[Via Campo Grande News]
As lojas do Centro de Campo Grande costumam abrir por volta das 7 ou 8 horas da manhã, mas na rua Sete de Setembro há um lugar onde os clientes madrugam. No número 496, entre a 13 de Maio e a 14 de Julho, se passar antes das 6 horas, já é possível achar alguém esperando por Lázaro, barbeiro com quase 50 anos de profissão.
“Eu tenho uns clientes que chegam antes das 6 horas. Porque eu tenho aqui um tradicional cafezinho. Os vizinhos e o pessoal vêm tomar, porque eu sou um tomador de café e sei fazer um bom café. Tem dia de eu chego e o cliente está esperando na porta. Hoje mesmo, não eram 6 horas e eu estava cortando cabelo”.
O barbeiro conta que o cliente de hoje, um gerente de concessionária automotiva, chegou antes das 6 horas. “O que ele [o cliente] me falou foi que ele já tinha feito mercado, no 24 horas, e veio aqui. Ele disse que a mulher falou assim: você vai incomodar o Lázaro essa hora? E ele respondeu que essa hora eu já estava aqui. É sempre assim, antes das 7 horas eu já cortei cabelo”. Também clientes, que segundo o barbeiro, chegam logo cedo para conseguir estacionar sem problemas na rua Sete de Setembro.
Lázaro é madrugador desde sempre. Quando era bem novinho, morava na zona rural e acordava cedo para trabalhar com leiteria. Aos 19, entrou no quartel e manteve a rotina de levantar às 6 horas, quando é tocada a Alvorada. Assim, ele seguiu a vida inteira madrugando. “Levantava de madrugada para tirar leite e estou assim até hoje”. Para dar conta, ele dorme cedo. “A minha filha reclama a quando tem um aniversário e eu não vou mais. Essa noite ela foi a um evento e voltou 1h. Fiquei acordado”.
Foi no quartel que começou a carreira de barbeiro. Por lá, ele passou dois anos cortando o cabelo dos soldados. “De 71 a 72 era barbeiro no quartel e cortava o cabelo dos soldados da minha bateria. Na época da ditadura militar, o cabelo dos soldados era raspado quatro dedos e tinha que seguir isso. Saí [do quartel] e vim aqui para a Sete, me aperfeiçoei como profissional e estou aqui até hoje. É cabelo e barba. Nunca saí disso”.
Quando chegou à Sete de Setembro, em 1972, as coisas eram bem diferentes. Lázaro diz que quem trabalhava por ali, “assistia” em dia de chuva os carros atolarem na subida. “Onde é o ginásio da Mace tinha garças, era tudo água e a gente via as garças chegando e levantando. Da Rui Barbosa para lá, era tudo pedra, não tinha asfalto na Sete de Setembro para lá”.
Mudanças – Lázaro resiste em um ofício que já esteve meio esquecido e que nos últimos anos, voltou à moda. Ele conta que, no começo, os clientes eram da área rural e profissionais liberais que não deixavam de fazer a barba e cortar o cabelo com um profissional.
“No começo, os clientes eram da zona rural. Quando era sábado, eles vinham barbudos e cabeludos cortar a barba e o cabelo. Com a chegada do desenvolvimento e da tecnologia, do Mach 3 e outras coisas que facilitam, diminuiu a barba. Mas o último que eu cortei aqui, ainda cortei a barba dele”.
No salão, além de Lázaro, há mais dois barbeiros: Gilberto e Arthur. O primeiro é filho de um antigo companheiro de Lázaro no salão do Bicudo’s. O segundo, também trabalhou com ele no Bicudo’s e desde 2010 está com Lázaro.
“Eu não entrei nesse campo de hoje que é o degradê. Eu sou bastante ultrapassado. O meu companheiro que comprou a maquinha e faz. Está bem preparado para acompanhar essa modernidade”.
O salão do Lázaro praticamente não fecha. Aposentado e viúvo, ele tem quatro filhos: Ângela, Eliane, Ênio e Eudes. Só o último chegou a aprender a profissão de barbeiro, mas não seguiu e estudou Direito. Lázaro diz que não tira férias e que as viagens são de no máximo uma semana.
À moda antiga, barbeiro não faz barba em degradê, tipo pedido pelos mais novos (Foto: Henrique Kawaminami)
“O caçula morou no Acre e eu fui lá. Em Cuiabá também, mas é coisa de uma semana, no máximo”. Segundo ele, quando a esposa era viva, ela ia antes. “Tem a filha em Cuiabá e ela [a mulher] ia à frente de ônibus, nessa época passagem aérea ainda estava difícil, e eu ia de carro depois. Ficava o fim de semana e depois voltava”.
Já passaram pela cadeira do barbeiro diversas personalidades, políticos, juízes e desembargadores de Mato Grosso do Sul. Dos mais atuais, ele cita o ex-governador José Orcírio Miranda, o Zeca do PT, na época que ainda era bancário, o ex-deputado Júnior Mochi e o deputado Pedro Kemp.
“Doutor Wilson já cortou aqui também. O barbeiro oficial dele era o Zé, mas quando ele estava com algum problema, vinha aqui. Doutor Plínio Barbosa Martins, Múcio Terceira Júnior. O Demósthenes Martins, da Academia de Letras também. Ele trabalhou com Fernando Corrêa da Costa, trabalhou com o presidente Café Filho e contava as histórias”.
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